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  • Foto do escritorEduardo Sato

Sistemas complexos e o Nobel de Física de 2021


O físico Giorgio Parisi foi um dos laureados pela Sociedade Real Sueca com o Prêmio Nobel de Física de 2021.


Foram anunciados na semana do dia 11/10, os vencedores do prêmio Nobel de 2021 nas áreas de Medicina e Fisiologia, Física, Química, Literatura, Paz e Economia. Em especial, o Nobel de Física foi dividido entre duas pesquisas, sendo uma metade concedida ao pesquisador italiano Giorgio Parisi e a outra ao japonês Syukuyo Manabe e ao alemão Klaus Hasselmann. Ambas as pesquisas pertencem à área de Sistemas Complexos, conheça um pouco desta área fascinante e entenda a contribuição de Parisi para o entendimento da área. Precisamos falar sobre sistemas complexos. Parece um nome complicado, mas é mais simples do que você possa imaginar! Basicamente, um sistema complexo é composto por muitos elementos e apresenta comportamentos aparentemente aleatórios, isto é, que não podem ser explicados olhando apenas para suas propriedades gerais, mas que na realidade surgem a partir das interações dos seus constituintes. Em geral, as regras que ditam o comportamento dos elementos que formam o sistema são simples e a partir deles conseguimos entender as propriedades do sistema. Existem uma infinidade de exemplos de sistemas complexos, não só em sistemas físicos, como os vidros, mas também em outras áreas, como a sociedade, o clima, os organismos e sistemas econômicos. O mais impressionante desta área de pesquisa extremamente multidisciplinar é que vários desses problemas podem ser analisados usando as mesmas ferramentas matemáticas!


Os vidros de spin: materiais complexos, desordenados e frustrados

Um dos laureados, Giorgio Parisi, trabalhou em diversas áreas, levando a um avanço da teoria matemática das mesmas. Em sistemas complexos, Parisi estudou um material conhecido como "vidro de spin". Diferente das estruturas cristalinas mais comuns, onde os átomos estão dispostos de forma ordenada, isto é, equidistantes e repetindo o mesmo padrão geométrico, os vidros de spin são desordenados. Na Física, a maioria dos átomos se comportam como pequenos ímãs, emitindo campo magnético de forma intrínseca. A direção das linhas de campo é dada por uma propriedade chamada "spin". Por exemplo, em um material ferromagnético, todos os spins estão alinhados, isto faz com que os campos individuais se somem e o material macroscópico seja magnético.


Exemplo de ordem e desordem: na primeira imagem temos um vidro de spin e na segunda um material ferromagnético. Imagem por: Zureks - Wikimedia Commons


Já em materiais antiferromagnéticos, os spins se apresentam de forma alternada durante toda a estrutura cristalina, isto é, nos átomos vizinhos os spins apontam em direções diferentes, os campos magnéticos vão se cancelar e o material macroscópico não vai apresentar magnetização. Estas configurações de átomos se formam pois são as que minimizam a energia do sistema, sendo mais estáveis. Isto é uma regra geral da Física, a tendência de um sistema é ir pro estado de menor energia. Mas nem sempre é fácil encontrar o estado de menor energia em uma teoria! Considere um material com interações antiferromagnéticas em uma rede triangular. Mais especificamente, imagine um triângulo equilátero com átomos em seus vértices. Colocamos o primeiro átomo com spin para cima. O segundo átomo deverá apontar para baixo, pois isto minimiza a energia da interação. Mas pra que direção deve apontar o terceiro átomo? Sua interação com o primeiro átomo quer que ele aponte para baixo, mas a interação com o segundo quer que ele aponte para cima! Dizemos neste caso que o sistema é frustrado.



Exemplo de frustração em uma rede cristalina. Interações antiferromagnéticas (AF) têm sua energia minimizada quando os spins estão desalinhados. É impossível que esta condição seja satisfeita para todas as interações entre pares de partículas. Imagem por: Wikimedia Commons


Neste caso, teremos seis estados possíveis de menor energia e nenhum deles terá todos os vizinhos desemparelhados:

Mesmo um problema envolvendo três átomos possui uma grande quantidade de estados energeticamente equivalentes. Imagine quão mais complicado é este problema para um conjunto com muitos átomos!


Voltemos agora aos vidros de spin. Além de serem desordenados, implicando que a distância entre átomos não é igual, podemos ter interações tanto ferromagnéticas quanto antiferromagnéticas, o que leva a interações frustradas. Podemos ter a intuição de que este sistema tem muitos estados de energia mínima, qual deles será escolhido pelo sistema? Como podemos estudar este tipo de material?


Para entender a complexidade deste problema, vamos pensar em uma analogia. Imagine que tenhamos uma caixa quadrada e várias bolinhas de mesmo tamanho. Podemos preencher essa caixa diversas vezes despejando as bolinhas na caixa e dificilmente elas ficarão dispostas da mesma forma.


As bolinhas na caixa estarão sempre em um equilíbrio estável? Ou pode ser que uma pequena perturbação possa levar a um estado mais estável? Podemos por exemplo acabar em um estado onde as bolinhas fiquem presas em uma região da caixa e uma pequena balançada pode fazer o sistema mudar de equilíbrio. Ou até mesmo talvez seja possível que dado um tempo muito longo, o sistema esteja indo para um outro estado de equilíbrio, mas isto ocorre tão lentamente que não percebemos esta dinâmica.


A grande contribuição de Parisi foi encontrar padrões na matemática que descrevem estes sistemas complexos. Para estudar os vidros de spin, na época, existia uma técnica chamada Truque de Réplica. Sem entrar nos detalhes matemáticos, o truque de réplica não era bem entendido e produzia alguns resultados que não faziam sentido. Parisi desenvolveu um conceito chamado "Quebra de Simetria de Réplica" que lidava com estes problemas e possibilita o estudo dos vidros de spin.

Atualmente sabemos que a quebra de simetria de réplica tem aplicação em diversos sistemas, não se limitando à Física. O próprio Parisi mostrou que seu método era aplicável a diversos modelos de redes neurais, que são essenciais para resolver problemas de otimização e implementações de inteligência artificial.

Novas aplicações da quebra de simetria de réplica surgem a todo momento, mesmo aquele exemplo simples de bolinhas dentro de uma caixa pode ser estudado com este ferramental matemático e existem sistemas análogos na natureza, como a formação de cristais e o estudo de líquidos.


Referências e Saiba mais



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